domingo, 27 de outubro de 2019

Pregadores e palestrantes


Sou de uma família de tradição evangélica.

Tenho 2 irmãos (mais novos que eu) pastores.
Tenho um cunhado pastor.
Como toda família de “tradição pastoral”, o domínio do discurso religioso é uma característica.
Apesar de ser uma pessoa muito voltada aos livros e, de certa forma à palavra, nunca fui pregador.
Mesmo porque jamais conseguiria fazer as pregações típicas que falam que Deus vai fazer isso, Deus vai fazer aquilo, Deus de milagres ou, como aos poucos a essência das pregações vêm mudando, autoajuda ou enriquecimento material como prova de que o crente está na direção de Deus.
Fui professor de Escola Bíblica Dominical durante alguns anos e minha “prédica” era sempre uma tentativa de fazer os alunos participarem das aulas dizendo o que pensavam, refletindo sobre o que estava sendo dito, questionando, tentando se aprofundar nas questões. O que era muito difícil porque o crente via de regra não vai à igreja para pensar, refletir, mas para apenas “receber”, numa atitude típica de quem está preparado para ter seu cérebro “lavado” pela palavra.
Ontem à noite, vendo alguns minutos a pregação de uma amiga no facebook, desisti dada a preguiça que me abateu. Aquela pregação típica que fala que Deus vai fazer isso, Deus vai fazer aquilo, o segredo para o sucesso pessoal é isso ou aquilo (autoajuda).
Daí, remontando à minha memória, lembrei-me que minha última “pregação” foi há mais de 15 anos. Acho que fui convidado a pregar duas vezes apenas.
Naquela pregação, escolhi um texto bíblico dos evangelhos, não me lembro mais qual, e procurei refletir sobre os desafios que Jesus nos colocava a partir da sua parábola proposta. Nada de Deus vai fazer isso ou aquilo. Muito pelo contrário. Citei até Chico Buarque. Em uma Assembleia de Deus. Em um culto de domingo à noite.
No final da pregação, o pastor disse para a congregação: que palestra!
Rimos.
E nunca mais fui convidado a pregar novamente. Eheheh.
Ah, sim, no final do culto, uma ou duas pessoas vieram falar comigo que haviam sido desafiadas pelo que eu tinha dito, possivelmente a serem pessoas melhores. Fiquei feliz ao saber que elas não tiveram reforçadas a expectativa de que “a minha bênção vai chegar”. Eu teria ficado frustrado.

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