sexta-feira, 17 de maio de 2019

Memória de Petrushka e a velhice

Estou no quarto e ouço lá embaixo, na sala, o que o Felipe está ouvindo no Youtube. Ele sobe as escadas. - Pai, conhece Stravinsky? - Claro! Assobio o trecho que está tocando na TV e lhe digo: Petrushka. Ele fica surpreso que eu tenha "adivinhado" que música era. - Felipe, quando eu tinha 15 anos, quando recebi meu salário, a primeira coisa que fiz foi comprar dois discos daqueles grandões. Um com Sheherazade de Rimsky-Korsakov e outro com Petrushka de Stravinsky. - Você ainda tem esses "CDs grandões"? - Acho que não. Ele faz sua costumeira e quase interminável digressão sobre o assunto, pensando nas possibilidades do destino dos vinis, eu fico tentado a lhe dizer a diferença entre disco de vinil e CD mas prefiro não, ou terei que lidar com mais alguns minutos de digressões de sua mente criativa de 10 anos e, afinal, já deveríamos estar na cama. Ele desce as escadas e sobre algum tempo depois. - Pai, Petrushka começa assim: assobia as primeiras notas do balé. - Isso mesmo. - Eu conheço essa música faz tempo. Eu amo essa música! Fico pensando se não é mais uma viajada da sua mente fantasiosa ou se ele conhece há tempos mesmo. Até porque Petrushka não é uma composição popular. Mas ele deve ter se lembrado mesmo porque, lá embaixo, o piano segue tocando Petruska no Youtube e a frase inicial do balé não se repete ao longo da obra. Então ele se lembrou mesmo. Será que conheceu no Piano Tiles? Dei uma pesquisada hoje e não encontrei isso. Mas eu já ouvi Petrushka algumas vezes em casa e já comentei com ele. Será que ficou registrado na sua memória? Não sei... Preciso investigar melhor a questão. O interessante disso mesmo é algo que cada dia me espanta mais, na medida em que afundo aos poucos na minha areia movediça de sinapses cada vez mais precárias. Para eu me lembrar de uma coisa, hoje em dia, quase sempre preciso de algum estímulo forte. Hoje a Flavia Santos me perguntou se eu iria no evento amanhã. Que evento, o do Felipe? Deixa pra lá, ela respondeu. Deixei para lá por conta do estresse: era melhor não começar o dia com uma irritação desnecessária. Mas realmente não faço a menor ideia de que evento seria, e olha que gastei alguns minutos repassando o que eu faria amanhã. Lembrei-me de 2 possíveis eventos e citei o do Felipe porque era algo que eu tinha comentado com ela (vamos no sábado ao SESC ver a peça tal? O Felipe vai gostar). Mas não era esse o evento. Mas, se ela desse alguns detalhes, eu seria capaz de me lembrar. E esse evento pode ser algo que conversamos ontem, por exemplo. Eu posso simplesmente me esquecer totalmente. Daí vem um garoto de 10 anos e assobia o início de uma peça que não é popular, que tem uma melodia difícil, que raramente se toca e que ele mesmo deve ter ouvido pouquíssimas vezes? É, a velhice é uma desgraça mesmo... kkkkk

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