domingo, 28 de maio de 2017

Crônica de um desmaio anunciado

A vida moderna não é fácil. Se deixamos o turbilhão de compromissos assumidos, responsabilidades, pressões tomarem conta de nossas vidas, acabamos nos metendo em uma escalada vertiginosa de sucateamento do nosso organismo.

Foi o que aconteceu comigo nas últimas semanas. Pressões no trabalho, cargas horárias insanas (na última semana dormi apenas 6 h no intervalo de 3 dias), alimentação totalmente desregrada, uma cirurgia odontológica que me obrigou a tomar um anti-inflamatório pesadíssimo por 5 dias... Para quem tem gastrite, isso é um desastre.

Enfim, procurei o médico e acabei tomando o remédio receitado. Melhorei da gastrite mas percebi que alguns efeitos, que julguei colaterais, começaram a aparecer. No final das contas, ontem sentia muitas dores nos ossos. Fui ao Hospital Brasil ontem à noite, expliquei tudo para o médico e, para resumir, ele entendeu que não tinha a ver com a gastrite mas com a potencialização que meu estresse causou. Receitou alguma coisa e me disse:

- Se você quiser tomar um remédio na veia, já dá uma pancada e diminui essa dor.
- Por mim beleza.

Perguntou se eu tinha alergia a alguns tipos de remédio e, depois da minha negativa, me disse que iria receitar Tramal. Sei lá o que é isso, mas tudo bem.

Encurtando a história, depois de algumas etapas preparatórias, fui colocado em uma poltrona para receber o Tramal na veia, aos poucos, como um soro. Inicialmente, fiquei interagindo com meu celular. Depois de algum tempo me bateu um sono muito forte e preferi ficar de olhos fechados, semi sonolento. Até que terminou a medicação.

Os enfermeiros me liberaram e fui embora. Estava me sentindo meio grogue. Pensei: vou até o carro, descanso um pouco e, quando me sentir melhor, vou embora. Saí pala saída do Pronto Atendimento do Hospital Brasil, onde também é uma entrada de estacionamento. São uns 15 metros até a entrada de pedestres e veículo. Eu caminharia até lá viraria à direita, subiria a rua até meu carro que estava uns 50 metros de distância. Enquanto caminhava pela entrada do estacionamento, senti que a sensação de mal-estar aumentava. Comecei a andar mais rápido. Cheguei na calçada, virei à direita, dei uns 10 passos e me dei conta de que não conseguiria chegar no carro. Dei meia volta, uma sensação de desmaio inevitável tomou conta de mim, apertei o passo para tentar chegar ao menos na entrada do estacionamento e pudesse desmaiar em paz, à vista de alguém do hospital que passasse por ali.

Cambaleante, consegui chegar bem no limiar da calçada, na entrada do estacionamento, sentei-me e apaguei....

Deve ter sido um desmaio muito rápido porque, pelo horário das conversas pelo whatsapp com minha esposa, entre meu último contato com ela, ainda na medicação, e o contato depois que eu já estava em condições de falar, passaram-se 18 minutos. Então todo o processo do desmaio deve ter durado de 5 a 8 minutos no máximo.

A noite estava deliciosa. O chão parecia uma cama confortável. Aquele ventinho soprando... Ai... que delícia... Nossa, de onde vim, para onde vou, o que estou fazendo aqui? Ah, sim... estava me preparando para um desmaio feliz! Então eu desmaiei! Peraí! Onde eu estava mesmo? Ai, caramba, estou no hospital!!! Ai, meu Deus alguém tem que me encontrar...

Era por volta de meia-noite.

O tempo passa e nada. Tento me mexer e não consigo. Estou em um delicioso estado de torpor. Resolvo ficar ali, deitado, aproveitando. Em algum momento vai aparecer alguém. De fato, depois de algum tempo, ouço algumas vozes ao longe:
- Olha, tem um rapaz caído aqui! – é uma voz masculina.
Outra voz masculina se junta e começam a conversar. Um deles mexe comigo.
- Ei, rapaz, você está bem? Você me ouve?
Eu ouço tudo, distante, mas não consigo me mexer. Os dois ficam ali discutindo o que fazem, um deles diz que vai entrar no hospital e chamar os médicos. Isso me faz concluir que são transeuntes que me encontraram.

Passam-se alguns minutos, o rapaz tentando conversar comigo, eu não consigo responder, tento soltar um gemido para ele ver que estou “bem”. Não sei se adianta porque ele continua falando comigo. O outro rapaz aparece de novo dizendo que enfermeiros virão me resgatar. O que me acompanhou diz que eu devo ter saído dali porque estou com papéis do hospital e a pulseira do atendimento. Observa também que devo estar sozinho porque há uma chave de automóvel jogada ao lado do meu corpo. Quer dizer, meu corpo não, porque, pelo que consta, ainda não morri. Ou estaria ouvindo o diálogo do céu, justamente por isso ele parece estar meio longe? De qualquer forma, o rapaz me parece muito sagaz. Se estivesse em melhores condições, dir-lhe-ia (oi, Fora Temer?) que ele daria um ótimo detetive.

O rapaz, todo cuidadoso diz para o outro que, se ele quiser, pode ir, que ele fica comigo enquanto o pessoal do hospital não chega. Não me lembro, mas parece que o outro vai embora. O rapaz continua a tentar me animar, falar comigo: “tudo bem?” Já que não consigo falar, tento fazer um positivo com a mão. Mal consigo mexer o braço e faço um sinal. Não sei se pareceu um positivo ou se ele viu. Mas, se viu, sagaz como é, sua veia detetivesca deve ter lhe sugerido que minha movimentação manual era uma tentativa de dizer que tudo estava bem.

Chegam os enfermeiros, ele faz um breve relato e diz:
- Essa chave deve ser dele. Vou colocar no bolso dele, ok?
E o faz.

Os enfermeiros falam comigo, respondo em palavras mal articuladas, já estou melhor, e eles me dizem que vão me levantar para colocar na maca. Eu tenho a impressão de que eles estão dizendo para eu me colocar de pé com a ajuda deles. Por um breve momento fico imaginando como isso seria possível. Mas nem preciso me preocupar: eles me erguem e meus braços caem como um saco de estopa vazio. Meus músculos parecem todos desligados.

Levam-me de volta para o hospital, me deixam em uma sala contígua a um almoxarifado e dizem para eu descansar, que eles vão me colocar no soro. Ouço alguém dizer que seria preciso iniciar o processo de internação e me deixar em observação, o que não me agrada nem um pouco. Perguntam-me se tenho acompanhante. Digo que não. Eles me respondem que, caso tivesse, eu poderia ser liberado depois de melhorar. Digo que vou contatar minha esposa. Imediatamente ela chama um Uber e vai ao hospital. Quase duas horas depois vamos embora.

No final das contas, eu que já tive diversos episódios de desmaio ao longo da vida e que, o que mais me agrada é aquele estado de torpor pré e pós desmaio, foi uma experiência agradável ficar naquele chão, totalmente relaxado, sentindo a brisa da noite, totalmente brisado, ouvindo as pessoas falando de longe... kkkkkkkkkk


Por outro lado, pareceu-me uma tremenda irresponsabilidade do médico que me atendeu e dos enfermeiros na sequência, não terem me falado que essa medicação é pesadíssima, perguntarem-me se tenho problema de hipotensão arterial (minha pressão arterial é mais baixa mesmo), enfim, esses cuidados de praxe.


Mas, enfim, tudo acabou bem e até me pareceu divertido. Teria sido problema mesmo, como disse meu amigo Hernan Pimenta, se em vez de serem os transeuntes que tivessem me encontrado, fosse o Dória: com essa minha cara de mendigo cracudo, eu corria sério risco de ser internado à força por ele. Já pensou a confusão depois que daria até eu ser encontrado em algum manicômio babando, metido em uma camisa de força?

terça-feira, 23 de maio de 2017

Nosso Brasil de cada dia


Quando a papagaiada do impeachment da Dilma iniciou, fui totalmente contra. Nem era preciso entender de política (até me chamaram de comentarista sênior de política no facebook) para sacar a furada: basta entender um pouco da alma humana. Era ÓBVIO que não se tratava de um movimento legítimo das massas buscando uma moralização na política mas uma manipulação massiva por parte de setores da sociedade e uma guerra de quadrilhas no poder. Eu até desafiei meus amigos detratores: esperemos 6 meses/1 ano e vejamos onde isso vai dar. Já deu pra ver, não?

Mas o mais interessante é que, em que pese toda minha admiração pelo Boechat, na época ele era um dos mais entusiastas defensores da lava-jato, um “patrimônio do país” que estava por fim fazendo história e que o movimento do impeachment era decorrência disso e não, nas minhas palavras, uma quadrilha no poder querendo derrubar a outra. Defendia ele que os políticos apenas estavam respondendo ao clamor das ruas. Como ele é um integrante da mídia, sempre achei que ele deixou seu amor pelo seu meio influenciar um pouco no seu julgamento, como se a mídia não fosse tão manipuladora. Enfim.

Fazia um tempo que não ouvia a Band por questões técnicas e hoje voltei a ouvir. Quando o Boechat começou sua fala matutina, fiquei surpreso ao ouvi-lo dizer que o impeachment da Dilma foi resultado de um segmento do poder que se levantou para derrubar outro. Foi basicamente o que ele disse. Nada de clamor das ruas, nada de passar o país a limpo. Nada. Tudo se reduziu, em outras palavras, ao que eu dizia desde o início: guerra de quadrilhas políticas. Não sei quando ele mudou de opinião, mas bastava ser um pouco coerente e se render às evidências que sempre estiveram claras para mim (desculpaê Boechat eheheheh).

Quanto aos meus amigos detratores, parte deles se renderá aos fatos, parte deles – eu percebo isso claramente – se manterá às suas fieis ilusões ideológicas, e parte deles voltou à letargia, esperando à próxima convocação da mídia para que coloquem a camisa da seleção e derrubem o governo.

segunda-feira, 22 de maio de 2017

24 anos de casamento

No passado, quando não havia navegadores, quando não havia smartphones, quando não havia GPS, quando dependíamos de um bom e velho mapa, tínhamos a alternativa de andar com o mapa debaixo do braço, ou um guia de ruas de dimensões bíblicas ocupando quase todo o porta-luvas do automóvel, se o tínhamos. Chegar a novos sítios era uma aventura quase sempre recheada de desencontros, atrasos, às vezes raivas e boas histórias. E, sempre que possível, dávamos um jeitinho com os mapinhas manuais, simplificados.

Tal como o mapinha que eu fiz para minha recém primeira e única namorada de como ela faria para chegar no ponto do tróleibus próximo à minha casa onde eu a estaria esperando para conhecer minha família.

Hoje, 28 anos depois, completamos 24 anos de casados. É tempo, hein? Dois filhos nas costas e um monte de história boa e ruim para contar, vamos aos poucos deixando nosso legado comum, nessa existência. Legado cheio de imperfeições, afinal não somos perfeitos e eu sou alguém muito complicado de se aturar, mas uma história bastante rica. Se nossos filhos puderem nos ver como pais que souberam lhes preparar para a vida, meu objetivo terá sido atendido com louvor. Quanto à Flávia, eu sempre lhe digo: da próxima vez escolha melhor o marido. AHAHAHAHAH!

Hoje é o dia de eu celebrar a metade da minha existência vivendo ao lado dessa mulher, decisão que tomei aos 24 anos de idade. Um brinde à Flávia, amor da minha vida.