(esse texto foi escrito em 2005, logo depois de ter sido assaltado; encontrei-o perdido por acaso)
Eu mereço
Ou
Como conseguir um B.O. em 1347 baforadas
alheias
Ou
O que a gente não faz por um pudim de milho...
Ou
Se eu encontro aquele frango de novo... mato
ele!
Ou
Viver no meio
da malandragem tem lá
suas compensações
Ou
Alegria de pobre dura pouco
Quarta-feira. 20:00. Depois
de várias páginas de livro e 5 conduções,
1 ônibus, 2 metrôs,
1 trem e outro
ônibus (pegar no batente não é fácil...), estava em
casa, olhando para
a Flávia. Que cheiro
estranho... Era
a metade do falecido frango que ela iria preparar para comermos. Por algum motivo desconhecido, o freezer
não conseguiu manter
o presunto com
um cheiro
agradável (frango
quando morre também
vira presunto?). Em face a esse acontecimento e outro
de igual relevância
– a sogra havia feito
um pudim
de milho para
seu genro
preferido – resolvemos ir jantar
lá. Aliás,
meu cunhado
não concorda que
eu seja o genro
preferido porque, segundo
ele, o genro
preferido é aquele que
não aparece. Segundo
esse raciocínio,
eu sou o genro
despreferido.
Como eu tinha que preparar um documento para enviar a um cliente e ainda
deixar uma rotina de outro cliente
executando via Terminal
Services (um tipo
de conexão remota
a servidor), deixei meu
notebook rodando a rotina
e fui para a casa
da sogra somente
com a mochila
de notebook recém-comprada e algumas coisas dentro, inclusive um livro que ia devolver ao cunhado.
Jantamos e, 21:30,
resolvemos ir embora.
Como a sogra
estava gripada, não
nos acompanhou até
o portão. Eu
saí, abri o portão, voltei com a chave,
saímos, a Flávia, o Vítor e eu e
tranquei o portão do lado de fora.
Tudo foi muito
rápido.
De repente, surgidos do nada,
eis que
4 indivíduos, liderados por um deles, nos assaltaram. O líder
do grupo veio cheio
de adrenalina:
- E aí, filho da puta, cê
tá armado? Passa a chave
do carro! Rápido,
filho da puta!
Os outros ficaram mais
próximos. Rapidamente, tomaram a chave do meu carro, minha mochila, a mochila
do Vítor que estava com
a Flávia e uma tartaruga de pelúcia que o
Vítor carregava. Só não
levaram o Snoop que o Vítor também portava. Ele
explicou mais tarde
o motivo: escondera atrás
do corpo.
Tão rápido quanto chegaram, pediram para
que ficássemos de costas,
entraram no carro e saíram cantando os pneus.
A Flávia chamou o pessoal que
estava dentro de casa,
o cunhado abriu o portão.
Ela estava passando mal
e, lívida e largada no sofá, foi atendida com
um copo
d´água preparado
pelo cunhado,
que antes,
se deu ao trabalho de ligar
no 190 para que
eu pudesse comunicar
o roubo. Prestíssimo e eficiente
esse cunhado!
O Vítor, como seria de se esperar de
uma criança de 5 anos,
chorou assustado e rapidamente entendeu que
se tratava de um assalto.
Em seguida
a sogra-avó chegou da igreja e suspirou
aliviada por constatar
que não
tinha chegado
minutinhos antes. Quem
sabe o que poderia
ter acontecido...
O sogro,
comunicado da “efeméride”
pelo celular, rapidamente
fechou seu ponto
comercial em
algum shopping da cidade
e foi para casa
o mais rápido
que pôde, ou
seja, em cerca
de 30 minutos. Embarcamos eu e a Flávia – o Vítor ficou protestando porque queria ir também para ver
os presos – e fomos até a delegacia da cidade.
Ah... tudo isso
aconteceu na cidade de Mauá.
Bem, lá na delegacia, no centro
da cidade, como
não seria de se admirar,
não fomos atendidos imediatamente.
Eles estavam lavrando um flagrante com 3 envolvidos, um
deles uma moça com
uma barriga grávida de 8 meses. Um
dos rapazes estava algemado. O outro não vi. Ela não. No máximo o policial pediu que ela ficasse
encostada na parede com
as mãos para trás. Imaginei que
fosse um tratamento
diferenciado em face
à vida que
se estava se desenvolvendo dentro dela. Um tratamento mais nobre,
digamos assim.
Somado ao flagrante, um outro acontecimento
de menor importância
levou a escrivã de plantão sugerir que
voltássemos no dia seguinte,
já que,
provavelmente, demoraríamos muuuuito para sermos
atendido: as fortes chuvas
do dia haviam derrubado o sistema.
Tá bom. Fazer o que. Amanhã a gente volta.
Embarcamos na caranga do sogro, gente finésima que,
prontamente, ao regressarmos à sua casa, me emprestou o carro
para que, no dia seguinte,
voltasse motorizado à delegacia que fica
muito mais
próxima da casa
dele que da minha.
Ah... eu moro em Santo André.
Voltamos para casa. Reparei que o carro do meu sogro, apesar de bem mais antigo que o meu, é mais mal
educado: você pisa
e ele responde mesmo!
É um Escort 1.8. O motorzinho da caranga
tá bom! Entre
um detalhe
e outro do acontecimento
que repassamos umas 357 vezes no caminho
de casa, chegamos.
Ah... eu também já tinha avisado ao porteiro
do meu edifício
que, se o meu
carro chegasse lá,
eles poderiam chamar
a polícia, que
eram os bandidos. Não
esperava que os caras
fossem tão loucos
assim, mas
nunca se sabe... Nos
pertences que
eles levaram estava meu
endereço.
Ao chegar
em casa,
contamos o acontecido ao porteiro, que nos dias seguintes
se encarregou de avisar a torcida
do Corinthians, o que era de se esperar de um porteiro que se respeite. Até
hoje tem neguinho no prédio perguntando: “Ah... vocês
foram assaltados?”, apesar de já termos posto uma pedra
em cima
do assunto. Só
pode ter sido obra
e graça do porteiro.
Enquanto voltávamos, agradeci a Deus
pela quase desgraça
alcançada: não nos
aconteceu nada. Só
levaram os anéis. E também fiquei
tentado, apesar de não
ter tido cara-de-pau
suficiente, a agradecer
pelo incidente
haver acontecido num momento
tão propício:
já havia 4 anos
que eu
comprara o veículo e está mais do que na hora de trocá-lo. Vendê-lo seria menos
rentável que
uma indenização do seguro
por perda
total, suponho. Portanto,
que ótimo momento para ser
roubado...
Ao chegar
em casa,
depois de mandar
um e-mail para
o cliente, justificando minha ausência
no dia seguinte
pois teria que
correr atrás
do B.O., quando me
preparava para ir tomar banho... o telefone toca: “Sr. Obadias? Aqui é a PM. Seu
veículo foi localizado!”.
Não acredito! Alegria
de pobre dura
pouco...