Era um sábado típico. Daqueles que eu chamaria de hoje. Descia
calma e civilizadamente a Rua Tabatinguera quando, em frente a uma igreja
católica que tem lá (Igreja Menino Jesus e Santa Luzia), uma pedestre pisou na
faixa. Parei. O carro que estava atrás
de mim buzinou extremamente irritado, fez uma manobra à direita e desceu alguns
metros na rua feito um torpedo. Outro carro em alta velocidade fez o mesmo,
seguido por uma SUV importada. Todos eles pararam alguns metros à frente já que
tinha trânsito no farol abaixo.
A moça na metade de caminho, em frente meu carro, meio assustada,
esperando os trogloditas se auto-afirmarem em seus bólidos. Abri o vidro do
carro, coloquei a mão para fora e sinalizei para que os potenciais desmiolados
que vinham atrás tivessem um pouco de civilidade e parassem. Pararam. Não sei
se pelo meu gesto ou por civilidade.
A moça terminou a travessia.
Continuei descendo a rua, vidro abaixado, fiz questão de
emparelhar com o idiota da SUV e meneei minha cabeça enquanto o olhava, como
quem diz “que bonito, hein?” Ele ficou me olhando com aquela cara de cu “não-tô-nem-aí”.
Esse é mais um pequeno detalhe desse retrato horroroso que é
essa nossa sociedade adoecida de pessoas que só pensam em si mesmas, necessitam
insultar e xingar os outros, gostariam de ter uma arma para estourar os miolos
de qualquer engraçadinho que tente “passar dos limites” e coisas do tipo.
Estamos longe, mas muito longe mesmo, de sermos uma “nação”
civilizada (tecnicamente, nem dá para dizer que somos uma nação). “Pessoas de
bem” é apenas mais um termo vazio utilizado “ad nauseum” para dar um lustre
civilizado às nossas pulsões violentas que estão à flor da pele, prontas para a
próxima agressão.