quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Deus no controle

Comigo não tem esse papo de “Deus no controle”, não. Comigo é “Deus no controle remoto”.

Explico:

Deus, sentado no seu alto e sublime trono, no seu período eternamente sabático, uma vez que resolveu pendurar as chuteiras depois de sua última criação (achou melhor não inventar mais moda), passa seu tempo de ócio assistindo a programação na sua TV Ultra HD 16k (como é dono do ouro e da prata, tem bala na agulha para esse tipo de extravagância – não é o meu caso, por exemplo).

Obviamente que a programação é única: a enfadonha vida dos seres mais importantes do Universo: claro, nós, os terráqueos.

Sempre que eu apareço na programação da TV, ele pensa: “Aff, esse chato de novo?”

Pega o controle remoto e muda de canal.

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Medo

- Pai, por que você desligou a luz do corredor?
- Para não ficar desperdiçando energia.
- Mas eu tô com medo!
- Você já cresceu, você não tem mais medo.
- Tá bom.

Pronto, problema resolvido.

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

O assalto

(esse texto foi escrito em 2005, logo depois de ter sido assaltado; encontrei-o perdido por acaso)

Eu mereço
Ou
Como conseguir um B.O. em 1347 baforadas alheias
Ou
O que a gente não faz por um pudim de milho...
Ou
Se eu encontro aquele frango de novo... mato ele!
Ou
Viver no meio da malandragem tem suas compensações
Ou
Alegria de pobre dura pouco


Quarta-feira. 20:00. Depois de várias páginas de livro e 5 conduções, 1 ônibus, 2 metrôs, 1 trem e outro ônibus (pegar no batente não é fácil...), estava em casa, olhando para a Flávia. Que cheiro estranho... Era a metade do falecido frango que ela iria preparar para comermos. Por algum motivo desconhecido, o freezer não conseguiu manter o presunto com um cheiro agradável (frango quando morre também vira presunto?).  Em face a esse acontecimento e outro de igual relevância – a sogra havia feito um pudim de milho para seu genro preferido – resolvemos ir jantar . Aliás, meu cunhado não concorda que eu seja o genro preferido porque, segundo ele, o genro preferido é aquele que não aparece. Segundo esse raciocínio, eu sou o genro despreferido.

Como eu tinha que preparar um documento para enviar a um cliente e ainda deixar uma rotina de outro cliente executando via Terminal Services (um tipo de conexão remota a servidor), deixei meu notebook rodando a rotina e fui para a casa da sogra somente com a mochila de notebook recém-comprada e algumas coisas dentro, inclusive um livro que ia devolver ao cunhado.

Jantamos e, 21:30, resolvemos ir embora. Como a sogra estava gripada, não nos acompanhou até o portão. Eu saí, abri o portão, voltei com a chave, saímos, a Flávia, o Vítor e eu e tranquei o portão do lado de fora.

Tudo foi muito rápido.

De repente, surgidos do nada, eis que 4 indivíduos, liderados por um deles, nos assaltaram. O líder do grupo veio cheio de adrenalina:

- E , filho da puta, tá armado? Passa a chave do carro! Rápido, filho da puta!

Os outros ficaram mais próximos. Rapidamente, tomaram a chave do meu carro, minha mochila, a mochila do Vítor que estava com a Flávia e uma tartaruga de pelúcia que o Vítor carregava. não levaram o Snoop que o Vítor também portava. Ele explicou mais tarde o motivo: escondera atrás do corpo.

Tão rápido quanto chegaram, pediram para que ficássemos de costas, entraram no carro e saíram cantando os pneus.

A Flávia chamou o pessoal que estava dentro de casa, o cunhado abriu o portão. Ela estava passando mal e, lívida e largada no sofá, foi atendida com um copoágua preparado pelo cunhado, que antes, se deu ao trabalho de ligar no 190 para que eu pudesse comunicar o roubo. Prestíssimo e eficiente esse cunhado!

O Vítor, como seria de se esperar de uma criança de 5 anos, chorou assustado e rapidamente entendeu que se tratava de um assalto.

Em seguida a sogra-avó chegou da igreja e suspirou aliviada por constatar que não tinha chegado minutinhos antes. Quem sabe o que poderia ter acontecido...

O sogro, comunicado da “efeméridepelo celular, rapidamente fechou seu ponto comercial em algum shopping da cidade e foi para casa o mais rápido que pôde, ou seja, em cerca de 30 minutos. Embarcamos eu e a Flávia – o Vítor ficou protestando porque queria ir também para ver os presos – e fomos até a delegacia da cidade.

Ah... tudo isso aconteceu na cidade de Mauá.

Bem, na delegacia, no centro da cidade, como não seria de se admirar, não fomos atendidos imediatamente. Eles estavam lavrando um flagrante com 3 envolvidos, um deles uma moça com uma barriga grávida de 8 meses. Um dos rapazes estava algemado. O outro não vi. Ela não. No máximo o policial pediu que ela ficasse encostada na parede com as mãos para trás. Imaginei que fosse um tratamento diferenciado em face à vida que se estava se desenvolvendo dentro dela. Um tratamento mais nobre, digamos assim.

Somado ao flagrante, um outro acontecimento de menor importância levou a escrivã de plantão sugerir que voltássemos no dia seguinte, que, provavelmente, demoraríamos muuuuito para sermos atendido: as fortes chuvas do dia haviam derrubado o sistema.

bom. Fazer o que. Amanhã a gente volta. Embarcamos na caranga do sogro, gente finésima que, prontamente, ao regressarmos à sua casa, me emprestou o carro para que, no dia seguinte, voltasse motorizado à delegacia que fica muito mais próxima da casa dele que da minha.

Ah... eu moro em Santo André.

Voltamos para casa. Reparei que o carro do meu sogro, apesar de bem mais antigo que o meu, é mais mal educado: você pisa e ele responde mesmo! É um Escort 1.8. O motorzinho da caranga tá bom! Entre um detalhe e outro do acontecimento que repassamos umas 357 vezes no caminho de casa, chegamos.

Ah... eu também tinha avisado ao porteiro do meu edifício que, se o meu carro chegasse , eles poderiam chamar a polícia, que eram os bandidos. Não esperava que os caras fossem tão loucos assim, mas nunca se sabe... Nos pertences que eles levaram estava meu endereço.

Ao chegar em casa, contamos o acontecido ao porteiro, que nos dias seguintes se encarregou de avisar a torcida do Corinthians, o que era de se esperar de um porteiro que se respeite. Até hoje tem neguinho no prédio perguntando: “Ah... vocês foram assaltados?”, apesar de termos posto uma pedra em cima do assunto. pode ter sido obra e graça do porteiro.

Enquanto voltávamos, agradeci a Deus pela quase desgraça alcançada: não nos aconteceu nada. levaram os anéis. E também fiquei tentado, apesar de não ter tido cara-de-pau suficiente, a agradecer pelo incidente haver acontecido num momento tão propício: havia 4 anos que eu comprara o veículo e está mais do que na hora de trocá-lo. Vendê-lo seria menos rentável que uma indenização do seguro por perda total, suponho. Portanto, que ótimo momento para ser roubado...

Ao chegar em casa, depois de mandar um e-mail para o cliente, justificando minha ausência no dia seguinte pois teria que correr atrás do B.O., quando me preparava para ir tomar banho... o telefone toca: “Sr. Obadias? Aqui é a PM. Seu veículo foi localizado!”.


Não acredito! Alegria de pobre dura pouco... 

domingo, 11 de setembro de 2016

Pablo Escobar, el gringo del mal


Quando assisti "Pablo Escobar, el patrón del mal", fui invadido por um sentimento de nostalgia, saudades da minha querida Colômbia, regozijo de rever aquele modo de falar tão peculiar, as gírias, tudo. O seriado é delicioso e, mesmo que sua produção seja inferior à de Narcos, para mim o resultado final é muito superior.

Por vezes, quando estou assistindo Narcos, apesar de gostar bastante da série, a sensação de “fake” é muito grande. Como, por exemplo, essa cena de um enterro. Nunca fui a um enterro de um oficial colombiano, mas fiquei com a impressão de que a cena foi construída como se tivesse acontecido nos EUA.

Lembro-me de uma cena de enterro em Pablo Escobar com a cara típica da Colômbia. Nem um pouco parecida com esse clima anglo-saxão dessa cena de Narcos.

Outra vez que a sensação de estar vendo algo muito “fake” foi uma cena em que assessores estão reunidos e o presidente da Colômbia entra na sala. Todos ficam de pé. Fiquei pensando: será que isso acontece mesmo na Colômbia ou os caras não conseguiram entrar no ambiente colombiano? Isso é comum na dramaturgia norte-americana porque isso deve acontecer lá. Esse tipo de reverência ocorre na América Latina? Confesso que não sei, mas me parece algo deslocado de nossa realidade.

Por fim, algo que me sempre me incomodou bastante foi o sotaque horroroso do Wagner Moura na 1ª temporada. Achei que ele deu uma boa melhorada na 2ª. Na primeira me dava aflição ouvir.

Apesar disso, Narcos é uma série muito boa também. Não se pode esquecer que está mostrando a história a partir do ponto de vista dos norte-americanos.

quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Sobre nossos pais e o que resta deles

Sempre aceitei o envelhecimento de meus pais, sua decrepitude e morte como um fato inexorável da vida. Sempre pensei a respeito e sempre me preparei para isso, psicologicamente falando.

Em princípio, sempre encarei a morte deles numa boa.

A única vez que eu fiquei abalado mesmo foi quando meu pai teve seu primeiro derrame e o vi deitado em uma cama do hospital. Saí para fora e chorei.

Depois daquele evento, talvez por ter sido meu primeiro contato com a fragilidade e finitude do meu pai, encarei os demais eventos com mais calma e naturalidade.

Quando ele morreu, cuidei dos aspectos mais chatos como fazer o seu reconhecimento no necrotério, já sem vida, levando as roupas que ele usaria, cuidar dos aspectos burocráticos com a funerária e tudo o mais. Nas visitas ao hospital, na semana que antecedeu sua morte, eu o via todo entubado, apagado, mas aceitava como uma espécie de rito de passagem. Confortava-me pelo fato de ele não parecer estar sofrendo.

Só me desestabilizei novamente quando o seu caixão foi fechado pela última vez no cemitério. Fui amparado por um amigo, o Eliézer Venâncio. Incrível como a gente não esquece essas coisas. Meu amigo ficará marcado para sempre na minha história por aquele simples gesto. Não me desestabilizei nos demais eventos não porque me quis fazer de forte, mas por essa forma racionalizada de encarar nosso ciclo de nascimento, existência e morte.

Quando da sua exumação, lá eu estava novamente fazendo toda a parte burocrática: pagar as taxas, acompanhar o desenterrar de seus ossos, colocá-lo em um ossário perpétuo. Peguei seus restos mortais e, enquanto íamos para o ossário, só me ocorreu sorrir e lhe dizer algumas vezes: "Grande Cição!"


Isso foi tudo. O seu legado mais importante está dentro de mim.